Mudança de rumo do governo visa impedir rebelião crescente por membros conservadores do Parlamento, mas foi capitulação humilhante para primeira-ministra
Porto Velho, RO - Cedendo à intensa oposição de parlamentares conservadores após uma reação do mercado, a primeira-ministra do Reino Unido, Liz Truss, voltou atrás nesta segunda-feira em seus planos de abolir a alíquota máxima do imposto de renda sobre os mais ricos, um elemento-chave da agenda econômica de corte de impostos de seu governo.
"Ficou claro que a abolição da taxa de 45% se tornou uma distração que interrompe nossa missão principal de lidar com os desafios que o país enfrenta", escreveu o ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng, no Twitter. “Por esse motivo, anuncio que não vamos mais prosseguir com essa supressão. Nós entendemos. Nós ouvimos".
O anúncio impulsionou a libra britânica, que havia sido derrubada por temores sobre os planos do governo. Por outro lado, foi uma capitulação humilhante para a primeira-ministra, um dia depois de declarar que iria em frente com os cortes de impostos que foram a peça central de sua campanha bem-sucedida para substituir Boris Johnson como líder do Partido Conservador.
A mudança de posição visa também conter uma rebelião crescente por membros conservadores do Parlamento. Vários sinalizaram que votariam contra o corte de impostos, e membros de alto escalão do partido previram que o governo, que está no cargo há apenas um mês, não conseguiria aprovar a medida na Câmara dos Comuns. Perder na votação do orçamento é equivalente, no costume parlamentar britânico, quase a sofrer um voto de desconfiança.
Além disso, o cenário do último mês levou ao fortalecimento da oposição: a última pesquisa YouGov, publicada pelo jornal The Times, deu aos trabalhistas uma vantagem de 33 pontos percentuais sobre os conservadores em uma hipotética eleição geral. Uma posição tão forte na esquerda britânica não era vista desde o apogeu de Tony Blair.
A mudança de rumo afastará uma sombra das finanças públicas britânicas. O valor da libra despencou quando Kwarteng anunciou inesperadamente em 23 de setembro que o governo aboliria a alíquota de imposto de renda de 45% aplicada àqueles que ganham mais de 150 mil libras por ano (cerca de R$ 9,1 milhões por ano).
O medo de que o governo tivesse que pedir empréstimos massivos para pagar os cortes levou a libra ao seu nível mais baixo em relação ao dólar desde 1985. Outros ativos britânicos também foram atacados, levando o Banco da Inglaterra a intervir nos mercados na semana passada para fortalecer os títulos britânicos do governo.
Até quatorze parlamentares conservadores já haviam sugerido que rejeitariam a medida quando chegasse à Câmara dos Comuns. Michael Gove, um dos políticos conservadores mais astutos e que recebe mais atenção da mídia, disse à BBC no domingo que seria um dos que votariam contra. Ele criticou duramente o governo, dizendo que “não era conservador” aprovar cortes de impostos não financiados.
A própria Truss também admitiu no mesmo dia ter se equivocado na forma como anunciou seus planos fiscais (sem o apoio de um relatório econômico independente e sem terminar de especificar algumas das medidas). A primeira-ministra sugeriu, também na BBC, que a ideia de abolir a alíquota máxima de 45% não havia sido dela, mas de seu ministro Kwarteng. E foi ele, finalmente, quem teve que mostrar a cara primeiro para tentar salvar a cara de Truss.
O ministro das Finanças, porém, disse ao programa BBC Breakfast, após o anúncio, que não tinha planos de renunciar.
Fonte: O GLOBO