Reajuste real do mínimo, recriação da Previdência e isenção maior do IR são expectativas de aposentados; entenda
Porto Velho, RO - Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a possibilidade de concessão de reajuste real ao salário mínimo —com aumento acima da inflação— deve ser a medida econômica de maior impacto para aposentados e pensionistas do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e trabalhadores que recebem o piso nacional.Em suas diretrizes econômicas apresentadas no plano de governo no primeiro turno, o aumento real do mínimo constava como um dos principais pontos, o que foi reafirmado na Carta para o Amanhã, divulgada na semana passada, às vésperas do segundo turno.
Aumento do salário mínimo impacta aposentadorias e pensões do INSS, salários e benefícios sociais e trabalhistas pagos pelo governo - Gabriel Cabral/Folhapress
O assunto ganhou força há cerca de dez dias após divulgação de plano do ministro Paulo Guedes (Economia) de desindexar o salário mínimo e as aposentadorias, abrindo a possibilidade de conceder reajuste menor do que inflação. Guedes negou o estudo, e Jair Bolsonaro (PL), que tentava a reeleição, chegou a prometer salário mínimo de R$ 1.400 em 2023.
O mínimo nacional é também o piso das aposentadorias e demais benefícios pagos pelo INSS. A correção concedida a ele reflete diretamente no bolso dos aposentados e nas contas da Previdência. Estima-se que, a cada R$ 1 a mais no salário, os gastos aumentam em R$ 364,8 milhões no ano. Bolsonaro não concedeu reajuste acima da inflação em seu governo.
NOVA FÓRMULA AINDA NÃO FOI DEFINIDA
A nova fórmula que poderá ser usada para a correção do salário mínimo e do piso das aposentadorias do INSS ainda não foi definida. Há uma expectativa que se repita a que vigorou de 2006 a 2019, com regra que levava em consideração a inflação do ano anterior mais o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes.
Essa fórmula pode ser resgatada, mas ainda não é consenso. Um dos estudos da área econômica da frente ampla que representou Lula é para que o reajuste leve em conta uma média do PIB dos últimos cinco anos, o que daria aumento real de 1,3%, mas também é estudado um percentual fixo de 2%.
A inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) em 2023 deve chegar a 6,54%, segundo a última projeção feita pelo Tesouro Nacional no final de setembro. A nova projeção será divulgada nos próximos dias. Já o PIB de 2021 teve crescimento de 4,6% ante 2020, ano mais forte da pandemia de coronavírus.
O economista Fernando Holanda Barbosa Filho, do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que há prós e contras. Segundo ele, do ponto de vista do aposentado, há um ganho. Mas, do ponto de vista do mercado de trabalho, a regra pode "expulsar" os trabalhadores do emprego formal, com uma menor formalização por parte de empregadores.
O problema está na baixa produtividade brasileira, diz ele, onerando empresas privadas, além do peso no Orçamento do setor público. "Obviamente vai melhorar a vida das pessoas se tiver aumento, mas é um desafio", afirma.
APOSENTADOS ESPERAM POR REAJUSTE MAIOR
Para Miguel Torres, presidente do Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados da Força Sindical), a fórmula anterior teve êxito e poderia ser retomada. "Eu acho que a fórmula PIB deu certo; é a que tem mais previsibilidade", afirma.
Segundo ele, durante a campanha, foi firmado compromisso com a equipe de Lula para que a política de valorização do salário mínimo —e do piso das aposentadorias— volte a valer anualmente no país.
Warley Martins, presidente da Cobap (Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos), que também participou de encontros de campanha, destaca o reajuste real do mínimo como uma das maiores expectativas dos aposentados a partir de 2023.
AUMENTO É FEITO POR DECRETO
Embora conste uma previsão no Orçamento federal, o aumento do salário mínimo é feito por decreto presidencial, que costuma ser assinado nos últimos dias de um ano ou no início do outro. No Orçamento enviado pelo atual governo, a previsão é repor a inflação, atualizando o salário mínimo de R$ 1.212 para R$ 1.302 em 2023.
Entre 2003 e 2006, primeiro mandato de Lula, o mínimo cresceu 35% acima da inflação. No segundo mandato, a alta real foi de 17%. Dilma Rousseff tornou lei a política de valorização, com aumento real de 12% e 4% no primeiro e segundo mandatos (duração de dois anos), respectivamente.
A inflação final, no entanto, só é divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) alguns dias depois do início do ano. Com isso, só é possível saber o valor exato a ser aplicado após essa divulgação.
OUTRAS MEDIDAS
Não é só o reajuste acima da inflação para o salário mínimo e o piso dos benefícios que anima os aposentados. Outras medidas que foram anunciadas na campanha de Lula e já são estudadas estão entre as expectativas, incluindo o que foi debatido com a categoria nos encontros durante a eleição. Veja quais são:
AUMENTO DA FAIXA DE ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA PARA R$ 5.000
A correção da tabela do Imposto de Renda, com elevação da faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 5.000, também deve beneficiar os beneficiários do INSS. Segundo Torres, calcula-se que cerca de 80% dos aposentados e pensionistas deixaram de pagar IR.
Além disso, se a regra que define o direito de isenção extra para aposentados a partir de 65 anos seguir valendo, o IR é cobrado apenas nos rendimentos mensais a partir de R$ 10 mil, valor acima do teto da Previdência, hoje em R$ 7.087,22, que pode ser corrigido para R$ 7.612 em 2023.
RECRIAÇÃO DO MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA
Warley Martins, da Cobap, afirma que a recriação do Ministério da Previdência é outra expectativa dos aposentados. O ministério deixou de existir no governo Bolsonaro. Hoje, o que há é uma Secretaria de Previdência sob o guarda-chuva do Ministério da Economia.
Para ele, essa é a melhor forma de negociar as demandas da categoria. "Sem o ministério não tem como gente negociar. Não tinha ninguém para nos receber nem que fosse para dizer 'não'. Agora, para nós, os aposentados, eu acredito que vai ser um pouco melhor, mais fácil. Vamos continuar lutando pelo que a gente acredita."
REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Pontos da reforma da Previdência podem ser revistos, segundo informações anteriores da campanha de Lula. Os representantes dos aposentados não contam com uma contrarreforma imediata, mas acreditam que é preciso um debate sobre o que afetou de forma mais significativa os segurados.
"A reforma foi muito danosa para muitas pessoas que contribuíram a vida inteira, mas é claro que a gente quer que a Previdência seja sustentável. Vamos ter que abrir o debate", diz Torres.
Martins aponta a mudança de cálculo nas pensões por morte como um dos fatores de maior impacto para os segurados, especialmente as mulheres.
A regra atual prevê que se pague 50% da aposentadoria que o segurado morto recebia ou ao benefício que teria direito em caso de invalidez mais 10% por dependente. Viúvos sem filhos recebem 60%.
"No debate [último debate da campanha, na sexta, 28], ele falou o que a gente tinha pedido, que é para rever as pensões. O valor que se paga às pensionistas não dá para elas sobreviverem", diz.
RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDAS
A renegociação de dívidas também deve beneficiar os aposentados, avalia Torres. Segundo ele, a macrorrenegociação proposta pela campanha de Lula ajuda a elevar ainda mais o poder de compra dessa parcela da população, livrando os os idosos da inadimplência e fortalecendo a economia.
REMÉDIOS E TRANSPORTE
A ampliação do programa Farmácia Popular, que distribuiu gratuitamente remédios básicos utilizados pelos mais velhos para controle de hipertensão e diabetes, por exemplo, também está no pacote da conta positiva para os aposentados, assim como o retorno da gratuidade nas passagens de ônibus para quem tem a partir de 60 anos.
Hoje, vigora norma que libera a gratuidade apenas a partir dos 65 anos. No estado de São Paulo, o governo enviou, na última sexta (28), projeto de lei para diminuir de 65 para 60 anos a idade no transporte gratuito.
No Orçamento de 2023, o governo federal resolveu cortar metade da verba do Farmácia Popular.
Fonte: Folha de São Paulo